É para estar na LOT ou não?
Essa é a questão que envolveu o projeto Vale Verde Encanto (VV) em reunião conjunta das comissões de Legislação e Urbanismo na manhã desta quinta-feira (2). O texto chegou à Câmara como proposta de iniciativa popular, com mais de 15 mil assinaturas, para modificar o zoneamento da região do vale do rio Cubatão. A dúvida é qual caminho o texto deve tomar na tramitação.
A dúvida surge porque o assunto colide com definições previstas para a região no projeto da Lei de Ordenamento Territorial (LOT) e as duas propostas alteram a Lei de Uso e Ocupação do Solo (Luos, LC 312/2010). O projeto da LOT prevê a revogação da Luos, o que faria com que uma aprovação prévia do VV pudesse não funcionar.
Na reunião, três caminhos foram apontados para a tramitação pelo advogado André Luiz Farias, que assessora o projeto VV.
1: VV primeiro, LOT depois
Se aprovado primeiro, o Verde Vale alteraria a Luos, e poderia ser incorporado depois à LOT, por meio de nova redação do artigo que estabelece as revogações, que retiraria a parte do projeto da LOT que mantém a região como zona rural.
2: VV vira emenda
Neste caso, o projeto do VV seria incorporado ao projeto da LOT como uma emenda, sendo discutido simultaneamente. Esta proposta foi defendida por André Luiz.
3: LOT primeiro, VV depois
Aqui, a LOT seria aprovada primeiro, e o projeto do VV seria aprovado posteriormente, alterando a LOT, e não mais a Luos. O vereador Manoel Bento (PT) considerou que este caminho era o mais indicado, por evitar possíveis judicializações.
Audiência Pública
Para ouvir a população local, o vereador Maurício Peixer (PR) propôs uma audiência pública a ser realizada na região. A data é 23 de junho, mas ainda não há local e horário confirmados.
O que diz o Verde Vale?
Enquanto o texto inicial da LOT propõe que a região do Cubatão permaneça como zona rural destinada a atividades agrossilvopastoris, o projeto Verde Vale divide a área em cinco regimes urbanísticos, permitindo novos usos, em especial com finalidades de ecoturismo.
O texto do Vale Verde regulamenta ainda atividades já autorizadas por licenciamento da Prefeitura, mas que não são contempladas pelo zoneamento rural atual (caso de clube de golfe e marinas). Uma das regiões do VV, que circunda parte do Jardim Paraíso, se destina à regularização fundiária, em especial pelos loteamentos irregulares instalados em área definida como rural.
O projeto VV foi apresentado pelo líder comunitário e ex-vereador Alodir Alves de Cristo e pelo urbanista Marcel Virmond Vieira. Ao explicar o projeto, Alodir fez menção ao desenvolvimento histórico, e disse que Joinville deveria ter sido planejada para ser ocupada a partir do bairro Vila Nova.
Cristo observou que o próprio nome do bairro indica isso e que a estrada da Ilha tem esse nome porque, em outras épocas, o caminho era utilizado para transporte de mercadorias para o porto de São Francisco do Sul.
Virmond, que participou da elaboração do Vale Verde, explicou que os urbanistas partem do princípio de que “uma cidade não deve crescer”. Como há um número elevado de loteamentos irregulares na região (entre 20 e 25, conforme o urbanista), já não é possível classificar a região como rural, mas também não é tão simples classificá-la como urbana.
Como áreas rurais são regiões com número de atividades e permissões juridicamente limitadas – e que têm como parâmetro o Código Tributário Nacional – a solução é transformar a região em área urbana, mas que possui índices mais restritivos de ocupação, mas estabelecendo maior número de permissões que o atual.
Abandono da agricultura?
Um dos temas mais debatidos na reunião foi a modificação da vocação econômica da região. Virmond observou, a partir do número de assinaturas coletadas para a apresentação da proposta, que moradores da região teriam mostrado disposição para alterar a vocação econômica da região.
Presidente da Associação de Moradores da Estrada da Ilha, o agricultor Ciro Harger contestou a afirmação de Alodir. Harger explicou que já foi formalizado um documento defendendo a manutenção da vocação econômica original. “Se não formos nós da agricultura, como é que na cidade o povo vai comer?”, defendeu.
Harger criticou, ainda, a “incompetência” da Prefeitura na liberação e fiscalização de loteamentos irregulares. A existência desses loteamentos estaria sendo usada como justificativa para alteração do zoneamento, conforme o agricultor.
O empresário do ramo imobiliário Anagê Alves da Silva disse que a área possui “aproveitamento zero”, em especial por, em seu entendimento, não haver muitos agricultores na região. Para Anagê, a mudança possibilitaria até mesmo maior arrecadação para o município.
O vereador Adilson Mariano (PSOL) questionou, por outro lado, a expansão do perímetro urbano quando a tendência urbanística é evitar a expansão da área urbana, conforme mencionado por Virmond. O parlamentar propôs uma emenda que permite que setores de regularização fundiária sejam implantados também na zona rural, o que facilitaria a regularização da região.
Representante da Câmara de Dirigentes Lojistas, Carlos Grendene defendeu que a proposta seja analisada com tranquilidade para evitar judicializações e para que a lei atenda as demandas de todos. “O Mariano tem razão, o Harger tem razão, o Anagê tem razão, então a gente precisa evitar a valorização de poucos privilegiados por meio de melhorar as proposições”, disse.
Texto: Jornalismo CVJ, por Sidney Azevedo / Foto: Nilson Bastian