A Comissão de Participação Popular e Cidadania da CVJ recebeu hoje membros que formaram a Comissão Municipal da Verdade (CMV) para conhecer o desenvolvimento e o resultado dos trabalhos e as pretensões para o desenvolvimento de pesquisas futuras. Os integrantes da CMV querem a continuidade da investigação histórica das violações de direitos humanos pela Ditadura Militar em Joinville e criticaram a atuação do coordenador, Luiz Henrique Lima, quando à organização dos trabalhos.

Para que a investigação continue, o presidente da Comissão de Participação Popular, vereador Dorval Pretti (PPS), pretende chamar representantes da Prefeitura para discutir a possibilidade de reabertura da CMV. O convite não pôde ser posto em votação hoje porque convites dependem de deliberação dos vereadores em reunião da comissão em que haja quórum (hoje só estavam presentes 2 dos 5 membros da comissão).

Outra possibilidade de prorrogação dos trabalhos foi proposta pelo vereador Adilson Mariano (PT). Uma vez que a Prefeitura não concorde com uma continuação dos trabalhos, o vereador sugere que a Câmara, a partir de proposição dos vereadores, possa formar uma comissão para que haja oportunidade de aprofundamento das pesquisas.

Encadernações

Versões do relatório final da CMV deverão ser encadernadas e encaminhadas pelo menos à Câmara de Vereadores. Inicialmente, conforme o consultor legislativo Denilson de Oliveira, representante da Casa na comissão, a intenção era a produção de um livro, que pudesse estar disponível também em outros locais. No momento está em curso uma licitação para que essas encadernações fiquem prontas.

Oficialmente, a CMV foi encerrada em 16 de dezembro de 2014, mesma data em que foi encerrada a Comissão Nacional da Verdade (CNV). O prazo estava determinado pela Lei Municipal 7.750/2014, que criou a CMV. O texto estabelece que o relatório final da Comissão Municipal da Verdade serviria de apoio às investigações da CNV e da Comissão Estadual da Verdade Paulo Stuart Wright (CEV-SC).

Parcialmente assinado

O relatório final da CMV não foi assinado por todos os integrantes da comissão. Os representantes do Curso de Jornalismo do Bom Jesus/Ielusc, o coordenador do curso, Sílvio Melatti, e do Centro de Direitos Humanos Maria da Graça Brás (CDH), o historiador Maikon Jean Duarte, se recusaram a assinar o documento entregue pela coordenação da comissão.

Melatti afirmou que considera que as audiências da CMV foram “mal articuladas”, marcadas em horários que os membros avisavam, antecipadamente, que não poderiam participar. Melatti também entende que houve uma “quebra de confiança” dos membros com a coordenação no momento em que ocorreu o depoimento de Afonso Carlos Fraiz, que não era aguardado pelos integrantes da CMV.

Isso ocorre porque Fraiz era relações-públicas do 62º Batalhão de Infantaria do Exército durante a execução da Operação Barriga Verde e atuou na prisão de Rosemarie Cardoso e de Júlio Serpa. A esposa de Serpa, Zilma, foi ouvida minutos antes de Fraiz, o que constitui um “crime moral ante os direitos humanos” no entendimento de Maikon porque seria preciso ouvir o ex-relações-públicas em contexto à parte, sem expor aqueles que sofreram a repressão à presença de um agente da repressão.

Relatório Final

Outra crítica foi direcionada ao relatório final. Sílvio Melatti diz que o relatório foi apresentado sem que os membros da CMV tivessem oportunidade de discutir o texto. Por esse motivo, não se sentia seguro para assinar o texto.

Para Maikon, o relatório apresentava, inicialmente, erros graves, como a referência a Fraiz como uma das pessoas que sofreram violência. A versão final do relatório foi reescrita e informações como essas corrigidas, conforme Iara Andrade Costa, que representou o Curso de História da Univille na CMV.

Pistas

Para Iara, o relatório final é um grande conjunto de pistas a partir das quais a verdade pode ser determinada. Segundo ela, o trabalho da comissão ficou limitado, dentre outras coisas, pelo tempo exíguo para coleta de informações. Iara observou que um relatório da CEV-SC indicou que em Joinville há pelo menos 63 pessoas que passaram por algum tipo de perseguição no período. Desses, só 7 foram entrevistados pela CMV. Em Santa Catarina, são mais de 600.

Dessas pistas, Maikon Duarte ressaltou que é preciso aprofundamento quanto às atividades do 62º BI e ao envolvimento da Fundição Tupy, citada em muitos dos depoimentos, a fim de ter um posicionamento institucional. Maikon, que atuou no grupo de trabalho da CNV que tratou sobre perseguição aos trabalhadores e ao movimento sindical, observou que é fato o envolvimento da empresa e que isso pode levar a um melhor entendimento do quie ocorreu. O relatório final da CNV cita a perseguição em Joinville e a atuação empresarial.

Também seria preciso, conforme o historiador, resgatar os reflexos da Ditadura na Câmara, como a cassação de mandato do vereador Ulisses Tavares Lopes. Uma sugestão do chefe de gabinete de Adilson Mariano, João Diego Leite, foi a possibilidade de uma devolução simbólica do mandato ao ex-parlamentar, que vive hoje em São Paulo.

Pedido de cancelamento

O então coordenador da CMV, Luiz Henrique Lima, chegou a mandar ofício à Comissão de Participação Popular e Cidadania pedindo cancelamento da reunião. Presidente da comissão, Pretti disse que o pedido “não fazia sentido” e que, em reuniões da Câmara, quem deve decidir a realização ou não são os vereadores.

Finalidade jurídica X finalidade histórica

Maikon questionou, também, o alto número de representantes ligados ao Direito na CMV. Havia somente dois historiadores na comissão, o que, para ele, prejudicaria o trabalho, em especial no aspecto do método. Segundo Maikon, uma vez que a comissão não tinha caráter jurídico, seu caráter poderia ser visto como acadêmico.

O consultor legislativo Mateus de Quadros apresentou um ponto de vista distinto. Para ele, nem jurídico, nem acadêmico, mas de averiguação das violações de direitos humanos, sendo “um espaço de protagonismo para aqueles que não puderam falar naquele momento”. A finalidade seria de coleta de dados, deixando a análise para as universidades, num momento posterior.

Para o representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) na reunião, o advogado Eugênio Pacelli, a CMV também tem finalidade jurídica à medida que fortalece a promoção da Constituição. No entendimento da OAB, uma prorrogação dos trabalhos da CMV é necessária.

Realização da Comissão

A CMV foi viabilizada por intermediação da Comissão de Participação Popular e Cidadania da Câmara, a partir de debates realizados com entidades de defesa dos direitos humanos, instituições de ensino superior e instituições como a Ordem dos Advogados do Brasil. No dia 9 de junho os vereadores da comissão e as entidades envolvidas na elaboração da comissão estiveram na prefeitura para apresentar a minuta de criação da comissão. Ficou a cargo do Gabinete do Prefeito (atual Secretaria de Governo) a coordenação da Comissão Municipal da Verdade.

Foto de Sabrina Seibel

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