Regularização fundiária é a principal reivindicação da audiência pública realizada no Morro do Amaral nesta terça-feira (8). Moradores da região enfrentam dificuldades para regularizar seus terrenos desde o estabelecimento da comunidade no início do século XIX. Eles levaram queixas também sobre a necessidade de médicos por mais vezes na semana, melhorias de infraestrutura para o único acesso por terra e retorno do serviço de ônibus voltado para alunos da região. Foram mais de 120 pessoas na região.

Um sentimento de abandono é muito intenso, a partir do que se pôde ouvir dos relatos dos moradores do Morro do Amaral. “A gente é esquecido”, pontuou Omar Lopes de Abreu, que observou que “Joinville começou por aqui”. A comunidade do Morro do Amaral é a povoação mais antiga da cidade, estabelecida ainda antes da vinda dos colonos alemães em 1851. A reivindicação de Abreu era para que a unidade básica de saúde da região contasse com médicos mais vezes durante a semana.

O morador Dejalma Borba, dono de petisqueira na região, classificou como “absurdo” que os habitantes da região não tenham endereço. “Se você for comprar uma televisão a prazo, é preciso buscar [os boletos] no Panagua”, disse, explicando a dificuldade da ausência de regularização fundiária.

A moradora Ana Paula Pereira questionou o motivo de a localidade ser menos atendida que outros bairros. A principal reivindicação dela é a disponibilização de espaços de lazer para as crianças. Outra reclamação de Ana Paula foi sobre um corte do serviço de ônibus que levava crianças de 5ª a 9ª séries da localidade para uma escola no bairro Paranaguamirim, a 4,6 km de distância.

Houve também reivindicações por melhorias de iluminação e de patrolamento da via de acesso.

Na audiência, ocorrida no Núcleo Espírita Eurípides Barsanulfo, estiveram presentes os vereadores Jaime Evaristo (PSC), Adilson Girardi (Solidariedade), Natanael Jordão e Odir Nunes (ambos do PSDB). Também estiveram presentes representantes das secretarias da Saúde, da Habitação e da Segurança Pública, além de líderes da comunidade do Morro do Amaral.

O Morro do Amaral

A região foi classificada como Parque Municipal da Ilha do Morro do Amaral em 1989. A região foi destinada à preservação ambiental de manguezais, algo refletido nas leis de zoneamento municipais, como a LOT, que dá à região o estatuto de Área Rural de Preservação Ambiental, com índices bastante restritos de ocupação. Porém, a área possui estatuto especial em razão de sua especificidade, tendo sido transformada, em 2012, numa Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS), o que permitiria a destinação de recursos federais para a área, desde que a região seja cuidada de maneira sustentável.

A população local se identifica como um bairro, embora o zoneamento coloque a localidade na zona rural de Joinville. Além disso, as descrições em lei dos bairros de Joinville não ultrapassam a linha do perímetro urbano, razão pela qual, legalmente, o Morro do Amaral não configuraria um bairro.

Geograficamente, o Morro do Amaral fica separado da cidade pelo chamado rio do Riacho, formando uma ilha, que historicamente contou com população entre 900 e mil habitantes. Porém, a comunidade teria hoje pouco mais de dois mil habitantes conforme levantamento recente da Secretaria da Saúde, mencionado pela diretora da atenção primária da Secretaria da Saúde de Joinville, Marlene Bonow de Oliveira.

Regularização fundiária

O crescimento populacional estaria relacionado a parcelamentos irregulares de terra, ponto principal do debate ocorrido no Núcleo Espírita Eurípedes Barsanulfo. Os pedidos por regularização fundiária apareceram em vários pontos da reunião.

O secretário municipal de Habitação, Romeu de Oliveira, explicou repetidas vezes durante a audiência que os moradores do levantamento que serviu para a criação da RDS, em 2012, seriam beneficiados com a regularização, porém, que os demais moradores poderiam ter de sair. Oliveira deixou claro seu posicionamento pessoal de que “compreende as pessoas que compram” terrenos em condição irregular, mas que não poderia ir contra a lei.

Alguns dos moradores receberam notificação de irregularidade pela Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente (Sama), o que poderia motivar a derrubada de casas. Um deles é Claudecir José da Silva. O morador disse “viver um tormento”, não tendo mais paz ao trabalhar pelo temor de remoção da família.

Em sua fala, Claudecir citou trecho da Constituição que assegura aos cidadãos brasileiros moradia digna e pediu um trabalho de conscientização da Secretaria de Habitação para esclarecer a população.

O vereador Odir Nunes (PSDB), Claudecir e outros moradores questionaram a ausência de informações relativas à proibição de aquisição de terrenos, como placas que deixassem clara a proibição.

Conforme Oliveira, a Secretaria de Habitação está trabalhando na suspensão das notificações até a elaboração de um plano de realocação ou, caso possível, um programa de regularização para as famílias envolvidas. Oliveira também afirmou que é necessário que a população busque informações com a Secretaria, que é o órgão responsável pela área.

Repercutindo a audiência, Odir afirmou na sessão desta quarta (9) que vai entrar com uma denúncia no Ministério Público pela ausência de fiscalização e ações da Prefeitura para evitar a ocupação irregular.

Plano de manejo

Para efetivar a regularização fundiária é necessário um plano de manejo da RDS, conforme explicação do secretário da Habitação, Romeu de Oliveira. O plano de manejo é hoje exigência do Ministério Público, segundo o secretário, que reconheceu que a Prefeitura “está devendo o plano”.

Acompanhar a elaboração, implementação e revisão do plano de manejo é responsabilidade do Conselho Deliberativo da Reserva de Desenvolvimento Sustentável da Reserva do Morro do Amaral. O Conselho é formado por 14 componentes, tem sete integrantes do Poder Público, além de outros sete da sociedade civil, e seria presidido pela Fundação Municipal do Meio Ambiente (Fundema).

Com as reformas administrativas, a fundação foi extinta em 2014 e as suas atribuições foram passadas para a então criada Secretaria de Meio Ambiente, Obras e Serviços Públicos (Sema), que no início deste ano incorporou outras funções e passou a ter o nome de Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente (Sama).

A composição atual do Conselho da Reserva estava presidida pelo diretor executivo da Secretaria de Infraestrutura (Seinfra), Thalles Vieira, até o dia 31 de março deste ano, conforme o Decreto Municipal 27.069.

Ponte

A única ligação terrestre do Morro do Amaral com a zona urbana é pela avenida Kurt Meinert, por uma ponte de pouco mais de 30m que foi alvo de reclamação pelos moradores. Thalles, que estava na reunião, mencionou que uma das medidas em estudo para melhoria da ponte é a colocação de muretas para proteção ou guarda-corpo. Omar tornou a falar e questionou se colocar mais peso sobre a ponte seria a melhor medida. Ele disse que a estrutura da ponte pode estar se deteriorando por fatores como a água do mar.

A construção de uma nova ponte, observou Thales, esbarra em questões de licenciamento ambiental e regularização fundiária.

Texto: Jornalismo CVJ, por Sidney Azevedo / Foto: Nilson Bastian

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