A Câmara aprovou nesta quinta-feira (11) em sessão extraordinária a criação do terceiro Conselho Tutelar de Joinville. A proposta está no Projeto de Lei nº 138/2019, da Prefeitura. O texto ainda vai passar pela segunda votação em Plenário, o que deve ocorrer na próxima segunda-feira (15).
A criação de um terceiro conselho é um pedido dos conselheiros que já vem desde pelo menos 2015. Conforme a Resolução nº 139/2010 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Joinville deveria ter cinco Conselhos Tutelares, no mínimo. O texto recomenda a existência de um conselho para cada 100 mil habitantes. Atualmente, Joinville tem apenas dois.
A Prefeitura encaminhou o projeto para a Câmara após decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. No fim de maio, a corte determinou a criação do conselho.
O projeto começou a ser debatido em Plenário na quarta-feira. Por falta de tempo, entretanto, em razão de outras votações, acabou sendo decidido nesta quinta-feira apenas.
Formação acadêmica
Houve divergência entre os vereadores quanto à exigência de formação dos conselheiros. Para a Prefeitura, eles podem ser graduados em qualquer área. Já para conselheiros que se manifestaram ontem na CVJ, sua função demanda formação em Ciências Humanas ou Sociais.
A exigência de formação nessas áreas é a regra que vale atualmente, conforme a Lei nº 3.725/1998, que regula os Conselhos Tutelares. O vereador Maurício Peixer (PR), por sua vez, chegou a propor destaque do inciso que possibilita que os candidatos ao conselho tenham qualquer formação.
Ainda na quarta-feira, Peixer também apresentou emenda no Plenário que seguiu em discussão ontem. A emenda foi feita em coautoria com os vereadores Iracema do Retalho e Ninfo König (ambos do PSB), Rodrigo Fachini (MDB), Odir Nunes (PSDB) e Tânia Larson (SD), e propõe que a formação dos conselheiros seja restrita a profissionais dos campos das ciências humanas, sociais, da saúde e da educação.
O vereador Richard Harrison (MDB), que é líder do governo na CVJ, relatou a proposta de emenda na comissão-geral no Plenário. Ele defendeu a rejeição da emenda, seguindo argumentação de representantes do Conselho Municipal dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes (CMDCA), segundo o qual a decisão de abertura da formação já havia sido incluída na proposta após debate interno no conslho.
Harrison disse que o mais importante é que o conselheiro conheça bem a rede de proteção do serviço público para fazer os encaminhamentos.
A conselheira tutelar Claudine Schatzmann Alves pediu que os requisitos atuais para os conselheiros sejam mantidos. Ela disse que já há um edital para o processo eleitoral dos conselheiros em andamento com os requisitos atuais. Ela propôs também que a discussão para alteração dos requisitos fique para um momento posterior.
Representante da Secretaria de Assistência Social no CMDCA, Lisielen Miranda Goulart explicou que o intuito da mudança no requisito referente à formação era a abertura para outras pessoas, de outras formações, citando como exemplo professores de matemática que atuam com crianças e que não poderiam ocupar a função em razão da graduação.
A presidente da Comissão da Criança e do Adolescente da Ordem dos Advogados do Brasil em Joinville, Katiuscia Amaro, defendeu a manutenção dos requisitos atuais, porque, na opinião dela, “profissionais de humanas e sociais são os mais qualificados para lidar com crianças em situação de vulnerabilidade”.
Reforçando o argumento de Katiuscia, o vereador Maurício Peixer comentou que uma preparação psicológica é necessária aos candidatos ao conselho, porque eles precisam dialogar com adolescentes que passam por abusos e uma formação específica pode fortalecer o conselheiro nesses momentos.
O vereador Roque Mattei (MDB) explicou que Joinville já vai além da legislação federal ao estipular mais que a simples exigência de curso de ensino médio.
Peixer ainda levantou a possibilidade de que a alteração transforme a eleição para conselheiro tutelar em uma eleição política, principalmente em razão do salário e da projeção do nome para outras eleições. “Não pode ser qualquer um para o Conselho Tutelar”, advertiu o vereador.
Nas comissões, já havia sido rejeitada uma emenda assinada por oito vereadores (além dos seis que apresentaram emenda no Plenário), que exigia ensino superior nas seguintes áreas: Administração, Arqueologia, Ciências Sociais, Comunicação, Direito, Filosofia, Geografia, História, Letras, Pedagogia, Publicidade e Propaganda, Relações Internacionais, Serviço Social ou Teologia.
Requisitos
Pela lei atual, além da formação em ciências humanas ou sociais, o candidato a ocupar a vaga de conselheiro tutelar deve ter ao menos 21 anos, morar em Joinville e ser eleitor no município, e demonstrar experiência de dois anos em trabalho com crianças e adolescentes, além de ter idoneidade moral.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8.069/1990) estabelece apenas a necessidade de idoneidade moral, a residência no município e a idade mínima de 21 anos. Leis municipais, porém, podem ter requisitos complementares, como é o caso da joinvilense.
Histórico
A demanda por um novo Conselho Tutelar na CVJ teve dois momentos. O primeiro ocorreu em 2015, quando houve expectativa pela criação do terceiro. Restrição orçamentária da Prefeitura foi o principal argumento para frustrar a iniciativa à epoca.
Em 2019, após a alteração na lei de eleições dos conselhos, que universalizou o eleitorado apto a votar, o tema de um novo conselho voltou à CVJ, porque a Prefeitura foi obrigada de criar um novo conselho inevitavelmente, após decisão judicial do TJ-SC sobre ação movida pelo Ministério Público.
Cronologia
Em fevereiro de 2015, conselheiros apresentaram aos vereadores um documento com pedido de respeito das autoridades municipais à autonomia do Conselho Tutelar e investimento em capacitação continuada dos membros e estrutura administrativa. Na ocasião, o vereador James Schroeder (PDT) fez moção, aprovada pela Casa, para que o município atendesse ao pedido.
A manifestação dos conselheiros na ocasião tinha como motivação o assassinato de três colegas do interior de Pernambuco, que faziam transição de guarda de uma criança.
Em abril dequele mesmo ano, o CMDCA pediu, pela primeira vez, a criação de um terceiro conselho tutelar na cidade. Na ocasião havia expectativa para que a Prefeitura encaminhasse projeto para a CVJ.
Em maio, a Prefeitura ainda não tinha feito o encaminhamento, por estimar que um novo conselho demandaria despesas anuais de R$ 1 milhão à época.
Em junho, os conselheiros explicaram que havia sobrecarga de trabalho. O coordenador do Conselho Tutelar Sul, Roberto Zacarias da Rosa, afirmou que eles atendiam, cada um, 300 casos.
A demanda por mais conselhos era acompanhada, inclusive, pela Secretaria de Assistência Social e pelo Ministério Público de SC, mas a Secretaria de Fazenda permanecia contra a criação de um novo conselho.