Os vereadores das comissões de Cidadania e de Proteção Civil se reuniram nesta quarta-feira (28) para discutir o desembarque de passageiros de ônibus fora dos pontos determinados entre a noite e a madrugada. A medida é voltada a mulheres, idosos e pessoas com deficiência, e tem como finalidade prevenir assaltos ou agressões físicas ou sexuais no deslocamento entre o ponto de ônibus e o destino do passageiro.
O debate de hoje foi motivado pelo Projeto de Lei nº 17/2017, de autoria do ex-vereador e atual deputado federal Rodrigo Coelho (sem partido), que obriga o desembarque fora do ponto entre as 21h de um dia e as 6h do dia seguinte, caso mulheres, idosos e pessoas com deficiência assim o solicitem. Presidente da Comissão de Cidadania, o vereador Pastor Ascendino Batista (PSD) é o relator da proposta.
O texto ainda prevê multa de dez unidades padrão municipais (o que corresponde atualmente a um valor próximo a R$ 3,2 mil) para a empresa de ônibus, caso o motorista se recuse a atender à disposição. Ainda outra multa é prevista para as empresas prestadoras do serviço, caso não coloquem cartazes próximos às portas de desembarque sobre o direito. Neste caso o valor é de 5 UPMs (em torno de R$ 1,6 mil).
Para o secretário de Proteção Civil e Segurança Pública de Joinville, Paulo Rigo, o projeto é bem-vindo. A única ressalva feita pelo representante da Seprot é que, segundo resolução do Contran, os ônibus de transporte coletivo não se enquadram como veículos de utilidade pública, razão pela qual não poderiam estacionar em locais proibidos pelo Código de Trânsito Brasileiro.
Abordagens são frequentes
A delegada de polícia Tânia Harada, a partir de informações a Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso de Joinville, afirmou que são frequentes as abordagens noturnas a mulheres que resultam em casos violência sexual. Tânia relatou aos participantes dois casos de estupro registrados no ano passado.
Segundo a policial, os problemas não ocorrem nos pontos de ônibus, mas sim no trajeto entre o ponto de ônibus e o destino dos passageiros. A delegada também observou que leis semelhantes já foram aprovadas em municípios como São José dos Campos e Campinas (ambos em São Paulo), embora ainda não haja ainda dados que apontem se as leis resultaram em redução das ocorrências.
A vereadora Ana Lucia Martins (PT) questionou Tânia sobre a disponibilização de dados mais precisos sobre a violência contra a mulher, mencionando que um pedido de seu gabinete ainda não tinha sido respondido. A delegada, porém, observou que em razão de uma orientação institucional, os dados não estão sendo disponibilizados diretamente pela delegacia; eles devem ser solicitados à Ouvidoria da Polícia Civil.
A presidente do Conselho Municipal de Direitos da Mulher, Simone do Nascimento Silva, defendeu a aprovação da proposta e citou três circunstâncias em que servidoras municipais sofreram assalto em ônibus ou no ponto de ônibus e recordou o caso Vitória Schier, uma jovem de 16 anos assassinada e estuprada enquanto voltava para casa após o desembarque do ônibus. O crime ocorreu em 2013 e causou comoção na cidade.
Além disso, Simone também revelou dados da evolução da violência contra a mulher no município em 2021, obtidos por meio do caminho indicado por Tânia. Entre janeiro e março, foram 1.136 ocorrências documentadas de violência doméstica, sendo que, destas, 406 ocorreram em março.
Ana Lucia retomou os dados apresentados por Simone e observou que há inúmeros casos não notificados às polícias. Além disso, a vereadora mencionou que pretendia apresentar um projeto nesses moldes, mas que ficou muito feliz em localizar um projeto com essa finalidade já tramitando na Casa. Ana ainda apelou aos colegas vereadores para “garantir que as mulheres possam viver com segurança em nossa cidade”.
Por outra perspectiva, o comandante do 8º Batalhão de Polícia Militar, tenente-coronel Celso Mlanarczyki Júnior, abordou especificamente casos de furtos e assaltos e informou que, entre março de 2020 e março de 2021, houve um total de seis ocorrências envolvendo pessoas no trajeto de casa para o trabalho, das quais quatro têm relação com o transporte público. Ainda segundo Mlanarczyki, apenas uma dessas situações envolveu o trajeto do passageiro no caminho entre o ponto de ônibus e o destino.
Todavia, para o comandante, ainda que as ocorrências sejam “pouco expressivas”, o “sentimento de segurança” e o conforto que o passageiro pode ter com a medida deve ser considerado, desde que o desembarque fora do ponto não inviabilize ou cause acidentes.
Empresas contestam efetividade
Representando as empresas de ônibus, o engenheiro Alcides Bertoli afirmou que o recurso de parada fora do ponto será pouco utilizado e que a possibilidade, se empregada, poderia “desregrar o sistema”. Segundo Bertoli, a possibilidade já existe em Jaraguá do Sul e há baixo número de pedidos de parada no horário.
“Se a lei existir, vamos cumprir”, afirmou Bertoli, observando que, em seu entender, “a lei é pouco eficiente no propósito”. Para o representante das empresas, a melhoria dos pontos de ônibus deveria ser a pauta em debate. Além disso, Bertoli ainda observou que a distância média entre os pontos de ônibus em Joinville é de 400m.
Todavia, Bertoli disse que o único pedido das empresas, caso o projeto se torne lei, é que o horário da obrigatoriedade da parada fora do ponto termine às 5h, e não às 6h. Isso porque o turno de trabalho de muitas indústrias inicia antes do horário previsto pelo projeto original, e um atraso em um ônibus nesse momento poderia causar transtornos.
Respondendo a uma pergunta do vereador Claudio Aragão (MDB) sobre uma possível elevação da tarifa no caso de o projeto ser aprovado, Alcides respondeu que provavelmente não, uma vez que o impacto financeiro do projeto seria baixo para as empresas, conforme o observado em Jaraguá do Sul.
Ascendino disse que levaria todos os pontos levantados em consideração na elaboração de seu parecer. Além dele, de Ana Lucia e de Aragão, também participaram da reunião os vereadores Brandel Junior (Podemos) e Luiz Carlos Sales (PTB).
O texto já teve parecer favorável nas comissões de Legislação e de Urbanismo na legislatura anterior e, na atual, recebeu parecer favorável do vereador Wilian Tonezi (Patriota) na Comissão de Finanças. Para virar lei, o texto precisa receber pareceres favoráveis de Proteção Civil e de Cidadania, antes de ser analisado pelo Plenário e, se aprovado, ir para sanção do prefeito.
Histórico
Além do PL 17/2017, há ainda o PL 225/2017, do vereador Adilson Girardi (MDB). Vale observar, ainda, que o texto de Coelho tem origem em uma proposta inicial de 2015 da ex-vereadora Zilnety Nunes.
A principal diferença entre as propostas em tramitação está na forma legislativa. A proposta de Coelho cria uma lei nova. O texto de Girardi, por sua vez, altera a lei do transporte coletivo (Lei 3.806/1998) para inserir a obrigação em alguns parágrafos específicos.
Outras diferenças são sobre o horário previsto para a chamada “parada segura” e sobre as multas no caso de não cumprimento. No texto de Coelho, como já escrevemos, o horário vai das 21h da noite de um dia e as 6h da manhã do dia seguinte. No texto no Girardi, esse horário vai das 22h às 5h.
As multas, contudo, são de 10 UPMs, no texto de Coelho, e de 5 UPMs, no de Girardi. Relembrando: no texto de Coelho há, ainda, uma multa de 5 UPMs para o caso de não serem afixados cartazes nos ônibus sobre o direito à parada segura.
O texto de Girardi recebeu parecer favorável na Comissão de Legislação, mas também deve receber pareceres de Urbanismo e Proteção Civil.
Há leis como essas em Curitiba (desde o início da década de 1990), Porto Alegre (2000), Florianópolis e Pelotas (2014), Londrina (2017) e Gaspar (2018).