O bairro João Costa recebeu nesta quarta-feira (3) a segunda audiência pública para discussão de dois projetos de lei que buscam ampliar a segurança nas escolas. O debate vem na esteira do ataque ocorrido a uma creche em Blumenau no mês passado que resultou em quatro crianças mortas. Ambas as propostas coincidem em prever guardas com armas de fogo nas unidades escolares, ponto que motivou divergência expressiva entre presentes na audiência.

A discussão entre pais, professores, gestores escolares e autoridades municipais resultou no surgimento de muitos argumentos e observações sobre o tema. Cerca de 200 pessoas acompanharam durante duas horas o debate sobre o PL 56/2023, de autoria do vereador Wilian Tonezi (Patriota), e o PL 57/2023, do vereador Claudio Aragão (MDB).

Entretanto, os projetos não se reduzem à previsão de armas em escolas, e trazem outros aspectos referentes à contratação e disponibilidade dos armamentos e outras medidas de segurança, como a exigência de detector de metais, o levantamento de ocorrências de violência em escolas, medidas de mapeamento de riscos à saúde mental, entre outras situações.

As propostas estão apensadas (isto é, tramitam em conjunto nas comissões da Câmara) e aguardam um parecer técnico da consultoria legislativa antes da votação.

A audiência foi presidida pelo vereador Brandel Junior (Podemos) e, além dos autores das propostas, foi acompanhada também pelo vereador Lucas Souza (PDT). Pelo governo municipal estavam presentes os secretários de Educação, Diego Calegari, e de Segurança Pública, Paulo Rigo. O comandante da Guarda Municipal de Joinville, Eduardo Ferraz, e o primeiro-tenente Rafael Rodrigo Bernardini Alvarenga, da Polícia Militar, completaram a mesa de autoridades.

Armas e escolas

O uso de armas de fogo em escolas por profissionais de segurança pública ou privada, foi o principal motivador de debates. Sobre esse tópico, o secretário Rigo pontuou que, embora seja defensor do posicionamento armamentista, entende a necessidade de equilíbrio emocional para o uso de um equipamento como esses. Razão pela qual acredita que não seja adequado prever que guardas privados portem armas em escolas.

Rigo pontuou que, entre outras medidas, é preciso observar que a própria Câmara já está analisando a conversão de agentes de trânsito em guardas municipais, o que reforçaria a corporação, e destacou o plano de colocação de totens de vigilância nas entradas de CEI, medida que já estava em andamento antes até do ataque em Blumenau.

Conforme o texto do projeto de Aragão, “será disponibilizado um guarda armado para cada unidade escolar do município, seja ele um Guarda Municipal, ou uma empresa privada de segurança contratada” [SIC]. A proposta de Tonezi é similar: “Todas as escolas da rede municipal de ensino deverão conter pelo menos 01 (um) vigilante portando arma de fogo durante o período escolar”.

O vigilante Marco Dubiel concorda com a presença de armas, inclusive com o porte por seguranças privados, mas frisou que essa medida precisa ter apoio da Polícia Militar e da Guarda Municipal.

Tatiane Abati Dias foi além. “Um guarda não é suficiente”, frisou, e sugeriu que o trabalho de disciplina que observa em escolas cívico-militares deveria ser expandido para toda cidade, embora reconheça que a presença de armas em escolas “não seja o que queríamos”.

Presidente da Associação de Moradores Padre Roma, Nelson Antonio Souza vê o projeto com preocupação. É contra a presença de armas em escolas e diz que é melhor que esse equipamento só seja usado após acionamento de uma empresa de segurança.

Posição similar foi defendida por Richel Marcelina, para quem as armas devem ficar fora das escolas, com empresas de segurança. Mas ele entende que a exigência deve ser por detectores de metal. Isso é previsto no projeto de Aragão, segundo o qual “serão disponibilizados detectores de metais nas entradas de creches e em todas as unidades de ensino”. O texto do projeto prevê essa disponibilização até para as unidades conveniadas, aquelas em que o município “aluga” as vagas.

A posição do engenheiro de produção Everaldo Brandão trouxe outros elementos para a cena. Ele observou que a presença de armas em escolas pode ser um risco adicional para alunos porque facções podem ter interesse em obtê-las dos vigilantes. Segundo ele, isso vai levar “a gente a ficar criando guarda, guarda, guarda, guarda…” Uma escola com maior presença das famílias reforçaria a segurança das unidades, afirmou.

Realidade e sensação

Já o secretário Calegari, por sua vez, preferiu discernir a sensação de segurança da realidade de segurança. Esta última, observou ele, seria quantificável e relativa às chances reais de um evento acontecer. Todavia, o secretário de Educação argumentou que a sensação é de caráter subjetivo e não necessariamente corresponderia à realidade.

Calegari afirmou que “segurança e saúde mental andam juntas”. Gestores escolares trouxeram posicionamentos próximos. A assistente social Sandra X, que trabalha na unidade, afirmou que “o maior problema da escola é o bullying”, e que “não é o uso de armas que vai resolver”. A gestora escolar Josedi Ferreira também destacou a necessidade de se trabalhar a questão da saúde mental.

Tonezi também incluiu em seu projeto a seguinte medida, relacionada à saúde mental: “Anualmente, pelo menos 80% dos funcionários de Escolas municipais deverão receber treinamento voltado à conscientização e identificação de possíveis sintomas que indiquem problemas relacionados à saúde mental de crianças e adolescentes, assim como a orientação de possíveis abordagens pedagógicas que identifiquem e previnam fatores existentes no ambiente que influenciem e potencializem a prática de ações lesivas à comunidade escolar”.

Cultura de paz

Josedi defendeu também o programa de cultura de paz, que guia as ações das escolas municipais. Nessa direção, a preocupação é com a “mensagem” que a presença de armas dentro de escolas traz para os alunos. Pensando nesse aspecto, a gestora escolar observou que propor o uso de armas em escolas é “tratar o efeito, e não a causa”. A visão foi reforçada por Rafaella de Sá Botelho, diretora de unidade escolar da região com mais de mil estudantes. Ela frisou a necessidade de dar mais assistência às famílias.

Alunos

Uma única voz trouxe o ponto de vista dos alunos. A vereadora mirim Melissa Marcelly de Lima Holz, que estuda na unidade, conversou com seus colegas e trouxe o que os estudantes reivindicam. “Precisamos de um treinamento para a gente se preparar e saber como agir; se a gente se esconde, se a gente se reúne em algum lugar…”, observou a mirim, do 9º ano. Melissa sentou-se com os vereadores na mesa de autoridades.

Calegari comentou, em sua fala de abertura, que a Secretaria de Educação tem se mobilizado para oferecer capacitações para os servidores das escolas, frisando que os gerentes e professores das unidades estavam cientes desse trabalho.

Muros

Lucas Souza observou que foi naquela escola que ele se tornou vereador mirim também, anos antes de se tornar vereador de fato. O parlamentar foi o primeiro egresso da Câmara Mirim a ocupar a função. Observou, da mesa de autoridades, que o muro da escola poderia ser ampliado.

Calegari observou que se trata de uma vulnerabilidade que a secretaria já identificou nas escolas.