Na tarde desta quarta-feira (21), a Comissão de Cidadania da Câmara de Vereadores de Joinville recebeu representantes do poder público, de coletivos feministas e da comunidade LGBTQIA+ para dar continuidade à discussão sobre um questionário de mapeamento dessa população em Joinville, além de políticas públicas destinadas a eles. A reunião foi solicitada pela vereadora Ana Lucia Martins (PT).

A coordenadora de Políticas para Mulheres e Direitos Humanos da Secretaria de Assistência Social (SAS), Deise Gomes, esteve na casa no dia 27 de junho, em uma reunião da Comissão de Cidadania, para prestar esclarecimentos sobre os motivos do questionário. Na ocasião, nenhum representante da comunidade LGBTQIA+ esteve presente.

Em resposta aos questionamentos da prioridade da pesquisa, feitos na primeira reunião, a presidente do GRES Diversidade, Kika Salomão, apontou que o Brasil é o país que mais mata pessoas LGBTQIA+ no mundo, e Santa Catarina é o quarto estado com mais registros de violência contra esta população, de acordo com o anuário brasileiro de segurança pública, com dados de 2020.

Ela reforçou que Joinville não tem dados, tampouco políticas relacionadas à comunidade LGBQIA+, sendo necessária a realização da pesquisa. Ainda relembrou que a única lei em prol desta comunidade é a Lei Municipal nº 6.430/2009, que institui 28 de junho como o dia do combate a homofobia em Joinville.

De acordo com Kika, desde que foi sancionada, nenhuma atividade pública aconteceu neste dia. “O estado precisa olhar todas as pessoas, todas as políticas”, apelou. “A violência passa pela saúde, pela educação, pela segurança pública, por todas as secretarias e setores públicos e privados em Joinville”, acrescentou. “Não estamos pedindo respeito, estamos exigindo”, pontuou. “Se a minha existência incomoda, eu te convido a existir nessa cidade, nesse país, como uma pessoa LGBTQIA+”, emendou Kika Salomão.

Direito legítimo

A presidente da Comissão de Diversidade Sexual e Gênero da OAB Joinville, Julia Melim, complementou, relembrando que os direitos da comunidade LGBTQIA+ são violados a todo momento. “Nós precisamos parar de falar sempre a mesma coisa, precisamos efetivar, colocar em prática projetos de lei que dizem respeito a essa população”, apontou. “Estamos reivindicando um direito legítimo, previsto constitucionalmente”.

A representante do Coletivo Feminista e Diversidade e integrante do Comitê de Políticas Públicas para população LGBT+ da SAS, Anelise Beck, comentou sobre a necessidade de mais representação feminina e LGBTQIA+ dentro do poder legislativo. Hoje a CVJ conta com duas vereadoras, Ana Lucia Martins (PT) e Tânia Larson (União Brasil).

Anelise pontuou, ainda, a negligência do poder público com a população LGBT. “A Prefeitura vai fazer mais um apagamento? Já não aceitaram a conferência municipal LGBT que nós reivindicamos desde o ano passado”, denunciou. “Não vão aceitar o questionário que está sendo feito? Que traz dados? O município vai dizer que a nossa população não existe?”, questionou.

A ativista social e representante do Movimento Feminista pela Diversidade, Scarlett Oliveira, resaltou a falta de visibilidade à população LGBTQIA+ nos Planos Plurianuais (PPA), nas Leis de Diretrizes Orçamentarias (LDO) e na Lei Orçamentaria Anual (LOA). Scarlett ainda apontou a existência de 530 células neonazistas em Santa Catarina, fato apontado pelo Ministério Público estadual, o que torna o território catarinense ainda mais perigoso para a população LGBTQIA+, na opinição dela.

O vereador Alisson (Novo) parabenizou Scarllet pelas colocações e reforçou a importância do debate. “Desde que eu acompanho essa Casa, é a primeira vez que eu vejo a população LGBT representada”, lembrou. “Eu sou favorável a esta pesquisa e espero que vocês voltem aqui”.

Alisson disse que está na hora de trabalhar a transversalidade, e que as pessoas LGBTQIA+, pretas, com deficiência, não pertencem somente à “caixinha” da assistência social. “Essas pessoas precisam também de saúde, de educação, precisamos olhar para essas pessoas”.

A vereadora Ana Lucia Martins encerrou a reunião, agradecendo a participação dos coletivos e organizações sociais na reunião de hoje. “Essa casa está aberta, essa casa é do povo, acompanhem os projetos, acompanhem as comissões.”

Ela citou dois projetos aprovados que interferem no dia a dia da população LGBTQIA+: um deles proibiu a utilização da linguagem neutra na administração municipal e o outro proibiu a existência de banheiros unisex na cidade. A vereadora reforçou que a participação da população LGBTQIA+ nessas discussões é fundamental.

Recomendações

De acordo com a gerente de enfermagem da Secretaria de Saúde, Vanessa Cardoso Pacheco, o serviço de saúde de Joinville segue recomendações de políticas públicas conduzidas pelo Ministério da Saúde, como a utilização do nome social, orientação sexual e identidade de gênero do paciente. “Quando saem novos decretos relacionados a políticas de promoção de saúde, orientamos nossa equipe técnica para promover as melhorias”.

O pensamento do ministério é que ao longo do tempo os municípios tenham os dados locais para fazer ações voltadas aos problemas da comunidade LGBTQIA+ na região. “Neste momento não temos ações específicas olhando para esses indicadores”, afirmou Vanessa. “Mas temos a alimentação dessa informação pelo sistema de saúde e pelas ações de política nacional integral dessa população”.

Pareceres

A comissão votou parecer contrário ao Projeto de Lei Ordinária nº 183/2021, de autoria do vereador Henrique Deckmann (MDB), que dispõe sobre a instalação de câmeras de segurança no transporte individual de passageiros no município de Joinville.

Além disso, foi aprovado o Projeto de Lei Ordinária nº 128/2022, de autoria do vereador Ascendino Batista (PSD) e Adilson Girardi (MDB). O projeto institui no calendário de Joinville a Semana Municipal de Evangelização, a ser realizada na última semana do mês de maio. O parecer do vereador Sales foi favorável ao projeto, com manifestação contrária da vereadora Ana Lucia Martins (PT), que salientou que o estado é laico e não deveria direcionar nenhum tipo de religião.

De acordo com o vereador Brandel Junior (Podemos), o projeto não diz respeito a nenhuma igreja, mas a evangelização no geral, e que estão presentes no calendário municipal datas relacionadas a outras religiões.

O vereador Alisson (Novo) disse que não está se criando nenhuma política pública para a semana, apenas uma data comemorativa, e que podem ser criadas outras datas para outros tipos de manifestações religiosas. Ainda apontou que a relatoria deu neutralidade ao projeto, não havendo problema algum com o prosseguimento.