Os vereadores da Comissão de Urbanismo discutiram na última quinta (14) a instalação da Unidade de Recuperação Energética (URE) em Joinville. Com R$115 milhões em investimento, a empresa terá 6 anos para construir a usina. A implementação está programada para iniciar até o final do primeiro semestre de 2024. Os equipamentos necessários já foram entregues na área designada para a obra no aterro.

Participaram da audiência pública, presidida por Adilson Girardi (MDB), o secretário de Infraestrutura Urbana (Seinfra), Jorge Sá, o gerente técnico da Empresa Ambiental, Everton Herzer, representantes do Coletivo Lixo Zero, da Associação de Catadores, da Subseção da OAB Joinville, além de membros da comunidade acadêmica e da sociedade civil.

A unidade de recuperação energética representa o investimento central entre as diversas obras, serviços, equipamentos e programas acordados durante a renovação do contrato entre a prefeitura e a Ambiental, empresa responsável pelos serviços de limpeza urbana na cidade. O Instituto do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (IMA) concedeu a licença ambiental em novembro, o que permite o andamento das obras de instalação da URE.

A URE deve processar diariamente 110 toneladas de detritos, o que representa 25% do total de resíduos domésticos gerados na cidade. Esse material será submetido a um processo de separação, trituração e secagem transformando-se em Combustível Derivado de Resíduo (CDR). O CDR será utilizado para alimentar uma caldeira de produção de vapor que, por sua vez, impulsionará as turbinas para a geração de energia elétrica.

De acordo com o gerente técnico da Empresa Ambiental, Everton Herzer, atualmente, são geradas mais de 120 mil toneladas de gás carbônico por ano. Com a URE espera-se reduzir cerca de 22% as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE). “O tratamento térmico emite 8 vezes menos emissão de GEE.”

“Contramão da energia limpa”

Para a professora doutora em Química da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Sônia Corina Hess, a queima dos resíduos urbanos vai na contramão das iniciativas de energia limpa. “Muitos países decidiram não optar por essa tecnologia, por ser uma energia suja, que contamina o ar.”

Durante a audiência, Hess apresentou um parecer técnico sobre o projeto de recuperação energética. Ela destacou que “não há separação dos resíduos” na descrição do processo. “Esse projeto é ilegal. Trata-se de um sistema movido a lixo bruto. O combustível nada mais é que o lixo seco, triturado, que foi tirado só o ferro.”

Sônia também ressaltou que o projeto pretende queimar os resíduos sólidos urbanos acima de 800º, o que caracteriza incineração, conforme a Resolução 316/2002 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), artigo 2º, inciso III, que dispõe sobre os procedimentos e critérios para o funcionamento de sistemas de tratamento térmico de resíduos.

A doutora em Química foi enfática ao alertar que a URE de Joinville está em desacordo com a Lei Complementar Municipal nº 29/1996, onde lê-se no Art. 26: “É proibido a instalação e o funcionamento de incineradores de lixo residenciais e comerciais.”

Além disso, a Resolução nº 190/2022 do Conselho Estadual do Meio Ambiente de Santa Catarina, também proíbe a queima em caldeiras dos resíduos sólidos ou equiparados.”

“O Conselho Estadual do Meio Ambiente de Santa Catarina proibiu a incineração da queima de resíduos porque na composição do lixo tem sólidos, cloro, mercúrio, cinzas, arsênio, cádmio e chumbo. As emissões fugidias que eles apresentaram são evitáveis, por isso existem tecnologias para isso”, destacou Sônia.

Coletivo Joinville Lixo Zero 

Membro do Coletivo Lixo Zero, Arthur Rancatti afirmou que a notícia recente sobre a instalação de uma unidade de recuperação energética, com custo estimado em R$150 milhões, levanta preocupações sobre a eficácia ambiental, uma vez que a cidade já conta com outras formas de geração de energia renovável, como eólica e solar.

Em conformidade com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, o Coletivo enfatiza a importância da hierarquia no tratamento dos resíduos, priorizando a não geração como o passo inicial. A conscientização sobre o consumo responsável é crucial, considerando que cada pessoa produz aproximadamente de 800g a 1 kg de resíduos por dia.

Segundo Rancatti, um ecoponto foi projetado junto à Secretaria de Infraestrutura Urbana (Seinfra), mas a Prefeitura de Joinville considerou o investimento muito alto e não deu continuidade. Ele disse que o principal problema na coleta do lixo reciclável é que os caminhões coletores levam para as cooperativas materiais não recicláveis.

“Há mais de um ano a coleta seletiva é feita com caminhão compactador e não está indo para as cooperativas porque inviabiliza a reciclagem desses materiais, o que é muito grave porque acaba indo para o aterro sanitário”, relata Arthur.

O Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) destaca a necessidade de reduzir em 20% o envio de resíduos para o aterro, mas as iniciativas atuais não estão alcançando esse objetivo.

A questão da compostagem surge como uma alternativa viável, especialmente considerando que metade dos resíduos em Joinville é composta por restos de comida. O Coletivo destaca a importância de desviar esses resíduos do aterro, seja por meio da reciclagem ou compostagem.

Pontos positivos da URE, segundo a Ambiental

  • Menor geração de metano no aterro sanitário. O metano tem um efeito de aquecimento 80 vezes mais potente que o CO² ao longo de 20 anos e 28 vezes num período de 100 anos, segundo a Global Methane Pledge.
  • Deixará de emitir 29.000t CO² – eq/ ano, equivalente a emissão de cerca de 30.000 automóveis em um ano (Fonte: CETESB, 2020);
  • Ao longo da vida útil do aterro (21 anos), isso equivale a 609.000 t CO² – não emitidos.
  • Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares) 2022: aumentar a recuperação energética de RSU, cujo objetivo é alcançar a potência instalada de 994 MW até 2040.
  • Contribuição para atendimento da meta do Compromisso Global de Metano, assumido pelo Brasil na COP26: reduzir as emissões globais de metano em pelo menos 30% até 2030, em relação aos níveis de 2020.
  • Contribuição para atendimento de compromisso pactuado junto ao IMA, de minimizar em no mínimo 20% os resíduos encaminhados aos maciços de resíduos sólidos do aterro sanitário até o término de validade da LAO.