Íntegra do Informe técnico nº1/2017

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1.1. Ementa

INFORME TÉCNICO. DIREITO TRIBUTÁRIO E FINANCEIRO. INSTITUIÇÃO DE BENEFÍCIO FISCAL QUE IMPLIQUE RENÚNCIA DE RECEITAS. COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO A RESPEITO DE TRIBUTOS QUE LHES TOCAM. INICIATIVA CONCORRENTE ENTRE O EXECUTIVO E O LEGISLATIVO. VEICULAÇÃO POR LEI COMPLEMENTAR. NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS EXIGIDOS PELO ARTIGO 14 DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL.

1.2. Introdução

O presente informe técnico tem o objetivo de registrar os requisitos necessários à veiculação de proposição que institua benefício fiscal do qual decorra renúncia de receitas à municipalidade.

Tendo em vista o objetivo almejado pela modalidade de trabalho em questão, tais requisitos serão analisados de forma similar à que é feita pelos Consultores Jurídicos desta Casa quanto à admissibilidade das proposições que lhes são submetidas (requisitos de (1) Competência do Município, (2) Iniciativa Legislativa, (3) Forma e (4) Formalidades para Apresentação da Proposição estabelecidos pela Constituição (Federal e Estadual) e/ou pela Lei Orgânica do Município de Joinville (LOM)).

1.2. Dos requisitos formais

1.2.1. Competência do Município

Nesse ponto, registra-se que os Municípios detêm competência para instituir benefícios fiscais a respeito dos tributos que lhes tocam, considerando-se as diretrizes traçadas pela Constituição Federal nos artigos que regulamentam o Sistema Tributário Nacional (145-156).

Assim, tratando-se de tributo de alçada municipal, certo é que, obedecidas as demais formalidades exigidas, é facultado ao Município instituir benefício fiscal a seu respeito.

1.2.2. Iniciativa

A instituição de benefício fiscal, em qualquer de suas modalidades, comporta dupla possibilidade de iniciativa legislativa: parlamentar e executiva, considerando-se que nem a Constituição Federal nem a Lei Orgânica Municipal reservam a iniciativa sobre tais projetos a apenas um dos Poderes.

E, diga-se: quando a Constituição e a Lei Orgânica Municipal optaram por reservar a iniciativa sobre determinadas matérias a um Poder ou outro, o fizeram de maneira clara e expressa, conforme se pode observar da leitura do artigo 61, da Constituição Federal e 37, da LOM. Nesse contexto, as hipóteses estabelecidas nos incisos do artigo 61, da Constituição Federal e 37 da Lei Orgânica são taxativas.

Porém, não havendo reserva assentada no texto dos diplomas acima citados, certo é que a iniciativa é concorrente aos Poderes.

Especificamente no que tange à instituição de benefícios fiscais, o entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal é claro no sentido de que não há reserva de iniciativa para leis dessa natureza. Conforme reiteradamente vem decidido aquela Corte, não se aplica ao caso o artigo 61, § 1º, da Constituição Federal, tampouco se aplica a regra contida no artigo 165, uma vez que o impacto dos incentivos fiscais nas contas públicas não transforma as leis respectivas em orçamentárias, de forma que a iniciativa para Projetos de Lei que tratem de benefícios fiscais é concorrente.[2].

Diga-se, em suma que: é viável a apresentação de proposta legislativa que tenha por objetivo a instituição de benefício fiscal do qual decorra renúncia de receitas. No entanto, essa renúncia de receitas deve observar os comandos versados pelo artigo 14, da LRF, e assim: deverá estar acompanhada dos documentos previstos pelo dispositivo e/ou de medidas de compensação da renúncia.

1.2.3. Forma

Com relação à forma de que se devem revestir os Projetos que veiculam benefícios fiscais, deve-se adotar a modalidade “Lei Complementar” considerando-se que: a) no âmbito do Município de Joinville apenas se pode veicular proposição sobre temática tributária por intermédio de Lei Complementar, conforme determina o artigo 33, I, da Lei Orgânica Municipal; b) questões afetas aos tributos Municipais devem ser, por consequência da aplicação da regra prevista no item “a” e da edição de Leis Complementares que os regulamentam (exemplos: Lei Complementar n.º 389/2013, que dispõe sobre o IPTU e Lei Complementar n.º 155/2003, que trata do ISS), veiculadas por Lei Complementar; c) em virtude da regra contida no item “a” e das disposições constantes dos artigos 32, § 1º, 33, 34 e 85, § 6º da Lei Orgânica Municipal, apenas Lei Complementar pode veicular pretensão tendente a instituir benefício fiscal.

1.2.4. Formalidades

Nesse ponto, cabe demonstrar que a veiculação de proposição que institua benefício fiscal do qual decorra renúncia de receita deve observar os estritos termos e requisitos estabelecidos pela Lei Complementar n.º 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).

Conceitualmente, pode-se afirmar que haverá renúncia de receita sempre que se fizer veicular algum benefício de índole tributária ou fiscal cujo resultado seja a redução dos ingressos nos cofres públicos.

Diga-se que, nos termos do parágrafo 1º, do artigo 14, da Lei de Responsabilidade Fiscal, são passíveis de veiculação de benefício fiscal com renúncia de receita os seguintes institutos: “anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado”.

Sobre cada um deles, pode-se sinteticamente expor que: a) a anistia, prevista nos artigos 180-182 do Código Tributário Nacional, estabelece a exclusão de uma infração tributária; b) a remissão, prevista no artigo 172 do Código Tributário Nacional, prevê o perdão de determinado crédito tributário; c) o subsídio atrela-se à concepção de auxílio financeiro concedido pelo Estado ao particular; d) o crédito presumido diz respeito a um abatimento estimado concedido pelo Poder Público ao contribuinte quanto a tributos de natureza não cumulativa; e) a isenção de caráter não geral encontra seu respaldo no artigo 179, do Código Tributário Nacional e determina a exclusão do crédito tributário quando preenchidos, pelo particular, os requisitos estabelecidos; f) as reduções de alíquota e de base de cálculo implicam, por consequência lógica, redução do montante devido do próprio tributo; g) outros benefícios fiscais que correspondam a qualquer tratamento diferenciado e impliquem redução na arrecadação.

Ao que se denota, pois, o conceito de renúncia de receitas é bastante amplo e, na prática, abrange quase todos os atos legislativos que beneficiem pecuniariamente o contribuinte, impedindo, reduzindo ou de qualquer forma prejudicando o potencial arrecadatório dos tributos.

É certo que a Administração está autorizada a conceder renúncias e, por conseguinte, provocar deliberadamente a redução das receitas públicas. No entanto, essa possibilidade está atrelada ao cumprimento das condições previstas no artigo 14, da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n.º 101/2000), verbis:

Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:

I – demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

II – estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

Observa-se, em síntese, que os requisitos exigidos pela legislação em comento para a viabilização da renúncia de receita são: a) demonstrativo da estimativa do impacto financeiro orçamentário da perda de receita no próprio exercício e nos dois subsequentes; b) observância da Lei de Diretrizes Orçamentárias e, ademais, pelo menos uma das seguintes condições: c.1) comprovação, pelo proponente, de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita presente na Lei do Orçamento Anual e que ela não afetará as metas de resultados fiscais previstas na Lei de Diretrizes Orçamentárias; ou c.2) instituição de medidas de compensação que impliquem aumento de receita decorrente de aumento da carga tributária, pelo período de três anos.

Visa a estimativa do impacto financeiro-orçamentário demonstrar que a perda de um determinado nível de receitas não causará impacto negativo ao orçamento e às contas públicas no exercício financeiro em vigor e nos dois seguintes.

O segundo requisito legalmente previsto, bastante amplo, preconiza que as metas e objetivos da Administração para o exercício e para os dois seguintes sejam cumpridos.

As duas condicionantes alternativas previstas nos incisos I e II do caput, do artigo 14, da Lei de Responsabilidade Fiscal têm os seguintes objetivos: a primeira tem por fundamento que a renúncia de receitas esteja prevista na LOA, por ocasião da estimativa de receitas e também de que não haverá prejuízo às metas estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais da LDO; e a segunda, ao determinar que o ordenador da renúncia promova medidas de compensação, busca garantir que não haverá perda de receita ao ente federativo (com essa medida, não haveria redução de ingressos aos cofres públicos, mas tão somente transferência da origem das entradas)[1].

Diga-se, em suma que: é viável a apresentação de proposta legislativa que tenha por objetivo a instituição de benefício fiscal do qual decorra renúncia de receitas. No entanto, essa renúncia de receitas deve observar os comandos versados pelo artigo 14, da LRF, e assim: deverá estar acompanhada dos documentos previstos pelo dispositivo e/ou de medidas de compensação da renúncia.

2. Conclusão

Tecidas todas essas considerações, assentam-se as seguintes premissas a respeito de Projetos de Lei que instituam benefício fiscal do qual decorra renúncia de receitas:

a) Compete aos Municípios estabelecer benefícios fiscais a respeito de tributos que lhes tocam;

b) A iniciativa de Projetos que tratam de benefícios fiscais é concorrente entre os representantes do Executivo e do Legislativo;

c) Proposições dessa natureza devem ser veiculadas por Lei Complementar, em observância aos artigos 32, § 1º, 33, 34 e 85, § 6º da Lei Orgânica Municipal;

d) É viável a apresentação de proposta legislativa que tenha por objetivo a instituição de benefício fiscal do qual decorra renúncia de receitas. No entanto, essa renúncia de receitas deve observar os comandos versados pelo artigo 14, da LRF, e assim: deverá estar acompanhada dos documentos previstos pelo dispositivo e/ou de medidas de compensação da receita a que se renunciará.

Joinville, 4 de maio de 2017.

Arthur Rodrigues Dalmarco

Deborah Pierozzi Lobo

Denilson Rocha de Oliveira

Maurício Eduardo Rosskamp

Consultores jurídicos – Divisão Jurídica/Divisão Jurídica Legislativa

[2] Cabe apenas assentar que as mencionadas “medidas de compensação” foram questionadas perante o Supremo Tribunal Federal por meio da ADIn n.º 2238/DF. No entanto, no julgamento de medida cautelar, aquela Corte Suprema entendeu que o instrumento em questão é válido e pode ser amplamente utilizado pelas Administrações dos entes da federação como forma de cumprir as condições para a renúncia de receitas.

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